Por Isabella Brescia
Evidências científicas têm demonstrado a efetividade das substâncias bioativas na promoção da saúde. Os ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa (AGPICL) apresentam singular importância ao organismo humano por constituírem membranas celulares, serem precursores de eicosanoides, atuarem no desenvolvimento cerebral e cognitivo, além de apresentarem efeitos positivos relacionados a doenças cardiovasculares, diabetes, cânceres e doenças hepáticas não alcoólicas. As duas principais categorias de AGPICL são os grupos ꞷ-3 e ꞷ-6, os quais são obtidos pelos humanos por meio da dieta. Estes ácidos graxos (AG) e seus metabólitos influenciam a composição da membrana celular e regulam a sinalização celular.
A família ꞷ-3 compreende os ácidos α-linolênico (ALA), eicosapentaenoico (EPA) e o docosahexaenoico (DHA). O ácido α-linolênico (ALA) possui duplas ligações nos carbonos 3, 6 e 9 e a partir dele o organismo humano pode produzir o ácido eicosapentaenoico (EPA) e o ácido docosahexaenoico (DHA), metabolitos com importantes funções cognitivas e anti-inflamatórias. O óleo de peixe é o principal representante de ꞷ-3, sobretudo os animais capturados em águas frias e marinhos. ALA também é encontrado na composição de óleos vegetais, como de linhaça.
A família ꞷ-6 compreende os ácidos linoleico (LA), gama-linoleico (GLA) e seus metabólitos: ácido dihomo-γ-linolênico (DGLA) e ácido araquidônico (AA). O LA é o principal AGPICL da dieta ocidental podendo ser encontrado principalmente em nozes, sementes e óleos vegetais, como a soja, o óleo básico da alimentação ocidental. Alimentos derivados dos óleos vegetais, como margarinas, apresentam níveis significativos de LA. Após a ingestão, o LA é metabolizado em GLA pelo organismo dos mamíferos.
Mamíferos não sintetizam o GLA, por isso, a obtenção ocorre por meio da dieta ou suplementação utilizando-se principalmente fontes vegetais. A partir dos óleos de sementes de borragem (Borago officinalis L.), prímula (Oenothera biennis L.) e groselha negra (Ribes nigrum L.) é possível a obtenção do GLA. No organismo, o GLA passa por transformações enzimáticas e metabólicas produzindo, principalmente, prostaglandinas e leucotrienos anti-inflamatórios, além de tromboxanos anti-agregantes plaquetários. Os eicosanoides produzidos justificam os possíveis benefícios de GLA frente a doenças anti-inflamatórias, como artrite reumatoide, síndrome pré-menstrual e dermatite atópica.
O estudo da função anti-inflamatória do GLA teve início nos anos 1980. Vegetais com quantidades significativas de GLA passaram a ser avaliados como eficazes para tratamento de doenças como artrite reumatoide e dermatites atópicas. O aumento da produção de DGLA e, consequentemente, de prostaglandinas de classe E1, afeta a quimiotaxia dos leucócitos, reduz a aderência dessas células aos vasos sanguíneos e inibe a ativação plaquetária. Outro fator importante da suplementação de GLA inclui a diminuição da metabolização de ácido araquidônico em leucotrienos pró-inflamatórios.
A síndrome pré-menstrual é uma condição que afeta 85% das mulheres e está associada a sintomas emocionais e comportamentais durante a menstruação, incluindo ansiedade, depressão, fadiga, cefaleia, mastalgia e irritabilidade. Acredita-se que a deficiência dos AGs essenciais causa a diminuição dos níveis de prostaglandinas de classe E1 e aumenta a sensibilidade à prolactina.
A suplementação com fontes de GLA pode ser ferramenta para amenizar a síndrome pré-menstrual, sendo o óleo de prímula um dos tratamentos mais populares. Em 1994, foi publicada a primeira meta-análise que comprova a eficácia do uso de óleo de prímula na melhora dos sintomas.
A artrite reumatoide refere-se a uma condição autoimune onde há concentração celular de macrófagos e células T no líquido sinovial. Esta proliferação resulta em inflamação das articulações, podendo causar destruição da camada cartilaginosa e óssea. O tratamento convencional da artrite reumatoide é realizado com medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais, os quais podem causar efeitos adversos importantes, como úlceras, hemorragias no trato gastrointestinal, problemas renais e aumento da pressão arterial.
Produtos que não promovam estas complicações são estudados e óleos de sementes de vegetais são uma opção segura. Óleos de prímula, borragem, groselha negra e de peixe são investigados como suplementos para uso em artrite reumatoide. O óleo de borragem se mostrou eficaz no controle das dores em pacientes acometidos por inflamações, incluindo a artrite reumatoide, sendo capaz de reduzir as doses dos medicamentos convencionais.
A dermatite atópica, sinônimo de eczema atópico, é uma doença crônica e complexa que resulta na inflamação da pele. Nos países desenvolvidos, a incidência da doença em crianças está em ascensão. As causas relacionadas ao desenvolvimento da patologia são multifatoriais e envolvem uma complexa relação entre fatores ambientais, genéticos e imunológicos.
O metabolismo anormal de ꞷ-6 é considerado um dos possíveis mecanismos responsáveis pela evolução de dermatite atópica. Os indivíduos apresentam baixos níveis plasmáticos de ꞷ-6, assim como nas membranas eritrocitárias e células do sistema imune. Níveis aumentados de LA são observados no leite materno de mães de crianças que desenvolvem a condição e também em fosfolipídios plasmáticos de crianças e adultos com dermatite atópica. As observações indicam possível redução da ação da enzima D6D, resultando em diminuição da formação de GLA e seus metabólitos.
O equilíbrio da razão entre AA/DGLA parece ser um fator determinante para a progressão da doença. O AA é componente essencial das membranas da pele, porém em níveis exacerbados resulta em inflamação e piora dos sintomas da patologia. A suplementação com fontes de GLA aumenta a produção de DGLA, amenizando a inflamação sem comprometer o funcionamento normal das células da pele.
A suplementação alimentar com óleos vegetais, como de prímula, borragem e groselha negra podem ser uma alternativa segura para manejo de síndromes e doenças inflamatórias. O DGLA plasmático é fator importante de estudo para determinar os aspectos fisiológicos e a regulação da inflamação por meio da suplementação de GLA.
Referência bibliográfica
DE CAMPOS, Luana Mayra; DE OLIVEIRA CARVALHO, Patrícia; RIBEIRO, Pérola. Ácidos graxos polinsaturados ômegas 3 e 6: benefícios a saúde humana e fontes. Investigación Clínica, v. 57, n. 3, 2005.
FERREIRA, Marcela Santos; ROCHA, Keli Daiane Camargo; GARCIA, Carlos Eduardo Rocha. Óleo de prímula como suplemento alimentar Evening primrose oil as a dietary supplement. Brazilian Journal of Development, v. 8, n. 5, p. 41440-41455, 2022.